Fala a verdade: quando o filho não é da gente, bem que dá uma vontade louca de sapecar uma bifa no moleque chiliquento! |
Ultimamente tenho pensando muito em crianças. Sei lá, talvez seja efeito do meu relógio biológico que já parou de marcar faz tempo: na verdade, está apitando desesperadamente feito sirene escolar, convidando a coroa aqui a encomendar logo um herdeiro antes que me apareça um neto. Eu, hein! Do jeito que as crianças de hoje estão precoces, não dá pra duvidar de mais nada!
Mas é sério. Não tem uma noite sequer em que não sonhe com bebezinhos enrugados e com carinhas de joelho, que de tão feios, chegam a ser lindos! Lógico que quando penso no quão encantadores e fófis eles são, surge logo a desejo de mandar meu problema da coluna para as cucuias e encarar de vez o barrigão. Mas esse entusiasmo também tende a diminuir quando visito algum amigo que tem filho pequeno. Nossa! Como a molecada dá trabalho, meu povo! Canso só de olhar.
Durante essa visita aos amigos-papais, fico observando o contraste na forma de se tratar as crianças de ontem e de hoje. A meninada dessa geração é praticamente a majestade do lar, a razão da existência de cada casal. Monopolizam as atenções, o orçamento familiar, os planos para o futuro, os desejos fugazes, os roteiros das férias, o controle remoto, fins de semana e a aplicação do 13º... Enfim, são eles quem mandam no pedaço. Muito diferente de quando eu era criança.
Claro que, considerando a minha idade, não era nada do tipo “absoluta e irrestrita autoridade paternal”. Até porque, se fosse assim, tadinho dos meus pais, que tiveram uma filha tão rebelde e contestadora. Mas ainda assim, era tudo muito diferente. Menino era tratado mais ou menos como se fosse um animalzinho de estimação, desses que são mais paparicados e ganham roupinhas coloridas e raçãozinha selecionada. Mas que ainda assim, não tinham vontade própria ou poder de escolha. Era para aceitar o que os adultos (os donos) determinassem ou escolhessem.
Minha mãe, por exemplo, às vezes tentava me tratar como um bibelô ou um robô. Duro era eu aceitar sem reclamar. Mas mesmo diante dos meus protestos, ela insistia em colocar-me em situações que na minha cabecinha representavam tortura e constrangimento infinitos. Quer um exemplo? Quando íamos fazer compras na Capital. As lojas da época não eram tão modernas e bem equipadas e poucas tinham provadores acessíveis e em quantidade (isso quando tinham provador). Então, quando ela via alguma blusinha interessante (e barata!) não contava pipoca: subia minha camiseta no meio da loja e me deixava seminua na frente do mundo inteiro, chocando toda a sociedade. Claro que estou exagerando, porque meus seios nessa época nem de longe denunciavam a fartura que viriam se transformar. E, portanto, ninguém dava a mínima para uma fedelha de 7 anos com dois ovinhos fritos de fora e vestida numa calcinha “bunda rica” (só os fortes entenderão). Mas minha mente fértil fazia imaginar a própria casa de vidro do Big Brother, com centenas de curiosos me observando e dezenas de câmeras dando closes indiscretos. Os efeitos desse martírio é que até hoje tenho dificuldades de trocar de roupa na frente de quem quer que seja. Quando estou no meio de uma prova no biombo de uma loja e sou surpreendida por alguma vendedora descolada querendo ver como ficou o modelito, tenho ímpetos de cometer um assassinato. Mas como a lei não permite, limito-me a fuzilá-la com um olhar de vergonha e indignação.
Outra demonstração de mais puro constrangimento do qual só as mães são capazes de nos infligir, era quando ela tentava de todas as formas (meio tortas, por sinal) alçar-me aos status da fama e do sucesso instantâneo! Certa vez, durante um show do Alípio Martins, o refinado cantor chamou alguma criança para cantar com ele um dos seus hits no palco. Sem ter noção do que estava acontecendo, só me vi flutuando acima das cabeças dos adultos, enquanto braços peludos e desconhecidos tentavam me puxar para cima do palco. É claro que fiz o meu show particular: abri o berreiro na hora, assustando público e produção! E ouvi durante horas as lamentações da minha genitora sobre a minha “matutice”. O trauma foi tão sério que até hoje não consigo ouvir “Ela é americana”, sem chorar.
Bom, deixando de lado as experiências particulares deprimentes e traumatizantes, não sou exatamente o tipo de pessoa mais indicado para dar pitacos sobre educação de monstrinhos. Até porque, ainda sou uma figueira seca, e fica fácil criticar os pais alheios (e os meus) quando não tenho um filhinho insistente e chantagista exercendo sua ascendência emocional sobre mim. Mas ainda assim, alguns exageros não posso deixar de comentar.
Acho muito saudável o exercício da autoridade paterna de uma forma racional e equilibrada. Não simplesmente “obedecer, por obedecer”, como se o fato de ser pai ou mãe torne uma pessoa infalível. E a autoridade cega, imposta mais pela ameaça do que pelo respeito e confiança mútuos, cria filhos instáveis e inseguros, com dificuldades de lidar com relacionamentos e manter sua autoestima em níveis saudáveis, que lhe assegurem bem-estar.
Por outro lado, filhos que comandam e monopolizam o lar, dobrando tudo e todos à sua poderosa vontade, tendem a tornarem-se jovens sem limites e adultos arrogantes e perigosos. Do tipo que não aceitam um não como resposta! E não se pode confundir determinação e coragem com prepotência e presunção.
Bem sei que quando chegar a minha vez de ser mãe, vou queimar a língua e enfrentar momentos apreensivos de chiliques e birras infantis com uma visão bem mais tolerante que só o amor incondicional é capaz de aplicar. Mas ainda assim, espero que meu amor seja suficientemente grande para vencer minhas próprias fraquezas e fazer aquilo que é certo para garantir ao meu filho um aprendizado definitivo e positivo para seu futuro! Ainda que esse aprendizado seja fruto de um “não” doloroso, dito na hora certa e do jeito certo!
Boa semana pra vocês!