terça-feira, 18 de junho de 2013

Eu vou te dizer para que serve um protesto!



Ontem à noite, fiquei arrepiada com a resposta que uma filha, simpatizante do movimento pelo passe livre, deu à sua mãe através do Facebook.

A mãe da jovem, que havia militado no movimento Feminista durante quase toda vida, hoje está “em casa, guardada por Deus, contando o vil metal!”. Resultado, talvez, de certo cansaço físico e emocional imposto pela idade e, sobretudo, por uma incômoda sensação de que seus esforços possam ter sido inúteis. Afinal, a violência contra a mulher atinge marcas cada vez mais alarmantes e a desigualdade de gênero ainda impera em nosso país.

A versão “madura” daquela mulher, que outrora lutou nas fileiras dos protestos dos anos 70 e 80, postou em sua rede social um contundente “sermão” contra os vândalos que estavam poluindo o meio-ambiente através da queima de pneus nas avenidas da metrópole.

A filha, indignada, respondeu o post com um misto de surpresa e revolta, afirmando desconhecer a própria mãe e enumerando sólidos argumentos que explicitavam não apenas a pequenez do gesto diante do arsenal de poluentes que são diariamente lançados no planeta pelas empresas, com a adesão e conivência do governo, como também todas as razões, muito mais abrangentes e profundas, que levaram àquela massa a empreender tamanho protesto.

Não enxerguei ali um desrespeito ou desamor filial. Muito pelo contrário. Vi, sim, a mais bela demonstração de reverência que uma filha poderia dar à sua mãe. Pois aquela jovem rebelde estava repetindo a cena que um dia sua genitora protagonizou, e demonstrando a firmeza de caráter moldado pelos princípios que certamente recebeu no seio doméstico. Uma educação que foi muito além da visão estreita e egoísta de uma sociedade cada vez mais individualista. Uma educação que mostrou através do EXEMPLO que a indignação deve sempre se sobrepor ao conformismo, e que a visão crítica deve prevalecer.

Pois é. Essa mãe hoje, talvez vítima de uma miopia que com o tempo se instaura nos mais bem intencionados olhos e, me arrisco a afirmar, com os instintos protetores maternos falando muito mais alto (o que é absolutamente compreensível), deveras desejava proteger sua cria e convencê-la, através de contradições, a sair do meio do olho do furacão. E que bom que isso soe contraditório para a moça! Que bom que ela diga “não te conheço!”! Sinal de que sua mãe demonstrou, na maior parte da vida, que era coerente com seus princípios e seu comportamento. E sua filha absorveu de tal forma essa realidade que se achou no direito de indignar-se e questionar aquele absurdo “lapso” temporário materno.

Essa mãe, ainda que aparentemente descrente em relação à própria fé, não falhou!

Mesmo que boa parte dessa geração que um dia brigou contra a ditadura, contra o capitalismo, contra a burguesia, tenha aos poucos sucumbido ao poder, ao dinheiro ou simplesmente ao conforto, ainda assim, deixou o seu legado!

O mínimo que se tenha obtido dessas lutas, o pouco que seja, É ALGUMA COISA!

A reprodução espontânea da rebeldia e do clamor generalizado, É ALGUMA COISA!

Ruim mesmo é o NADA! A INÉRCIA! O CONFORMISMO! A COVARDIA!

Só se aprende a fazer algo, FAZENDO!

Essa mãe recebeu da filha a mesma lição que um dia ensinou. É a mágica da vida, o feitiço do tempo se manifestando de forma sublime.

Eu sei que se hoje tenho o direito de escrever esse blog, de desfrutar alguma liberdade ou, no mínimo de poder manifestar a minha indignação quando ela é cerceada, devo em parte a essa mãe, que no passado brigou pelos direitos que agora usufruo.

Certamente me incomoda um pouco ver a guerreira mudar o seu discurso. Mas isso não será suficiente para deixar de acreditar em pessoas que lutaram como ela e muito menos na causa que defenderam. Até porque, tenho plena convicção que embora um pouco constrangida pelo “sermão” da filha, no fundo, no fundo, ela sente orgulho da nobreza de sua criação!

Vamos à luta, cunhãs!