segunda-feira, 4 de novembro de 2013
Um Q de Mulher
Toda mulher tem um “Q” de bipolaridade. Alheias às teorias da ciência, às especulações da filosofia e aos conceitos da religião, temos um jeito próprio de “funcionar”, que mescla princípios e desafia a lógica! Como uma nau capitaneada por um almirante meio ébrio, com uma tripulação de hormônios que oscila entre a apatia e o motim, seguimos sem ter certeza de nada. Queremos controlar tudo, mas sequer controlamos nossos pensamentos, sentimentos e mesmo o nosso corpo. Afinal, quem de nós não trava uma briga constante com o reflexo no espelho? Pra quem está de fora – Oh! Pobres homens! – é tudo uma tremenda confusão. Uma DR básica pode se transformar num espetáculo surreal, que começou como uma proposta civilizada e culminou no caos. Terreno delicado, areia movediça, assim é tentar trilhar os caminhos do nosso coração. Uma mulher curvilínea pode ser instigante, mas as curvas, reentrâncias e protuberâncias não chegam nem perto da inconstância do universo da alma feminina. Para nós, que vivemos essa montanha-russa - e que ao contrário do que muitos pensam, também sofremos com ela - é uma situação semelhante a ser cativa e ao mesmo tempo, algoz. Quanto a mim, por crer em outras vidas, várias vezes me peguei a esbravejar: “Na próxima, quero vir homem! É tudo muito mais fácil pra eles!” Mas se quer saber, quando passa o “piti” e a tal tripulação de hormônios adquire contornos mais “normais”, eu lamento a blasfêmia de renegar o meu gênero, porque no fundo, a facilidade é um tédio! E não é facilidade o que quero! Aliás, o que é mesmo que eu quero? Não sei... Amanhã, quem sabe, eu te digo!
quinta-feira, 12 de setembro de 2013
A menina do pé grande!
Desequilibrando-se na vaidade precoce... |
Dizem as más línguas que toda mulher que se preze tem de ser vaidosa. Deve
estar sempre bem vestida, cheirosa, de unhas feitas e cabelo arrumado. De
quebra, ter um sorriso cativante, um andar maneiro e sensual, modos delicados e
tom de voz contido. Tudo no “devido lugar”, como manda a mãe-natureza.
Não sei quanto às minhas companheiras, mas eu demorei a encontrar esta
mulher. Talvez a tal mãe-natureza tenha me considerado uma filha indesejada ou
estivesse ocupada demais para me repassar suas valiosas lições.
Ficou a cargo do mundo ensinar-me os “bons exemplos”. E tal qual a Fábula
do Corvo e do Pavão, um dia recebi a notícia de que meu pé não era nenhum
exemplar digno de idolatria podólotra.
Isso ocorreu quando eu tinha uns nove anos. Fase da vida em que a
preocupação básica é ser criança. Eu não olhava o mundo acima ou abaixo de mim,
a não ser quando era necessário dirigir-me a um adulto ou catar pedrinhas pelo
chão. Não me via torturada pelo sentimento pecador do orgulho nem angustiada
por fragilidades da autoestima. Nem sabia que isso existia! Eu vislumbrava o
mundo à minha altura, olhando de frente, numa sede de exploração infantil
guiada unicamente pelo desejo de diversão e conhecimento. Então, com tanta
coisa a fazer, a última coisa objeto da minha atenção seria o meu pé.
Acontece que eu tinha uma irmã mais velha. E uma mãe que jamais me
poupou das verdades. Essa irmã, sim, era um exemplar magnífico de feminilidade.
Cintura fina, corpo violão, voz aguda e falar comedido. Delicada como
porcelana. Vaidosa, ostentava sobre a penteadeira cremes de todos os tipos.
Disciplinada, aplicava-os diariamente. E eu não compreendia a razão de tanta
perda de tempo.
Certo dia a vi massageando os pezinhos. E descobri, vejam vocês, que
existia um creme específico para eles. Estava lá, impresso no rótulo:
“Hidratante para os pés”. Não para as coxas, para os joelhos ou para as
canelas, mas para os pés.
Na hora, pensei: o que aconteceria se ela se atrapalhasse e aplicasse a
substância em outra parte do corpo? Eram tantos frascos, tantos potes que não
seria impossível confundir. Temi por sua saúde, a imaginei perdendo os braços,
coitada, enquanto o médico comentava com a enfermeira: “É, não havia o que
fazer, ela aplicou nos braços o creme que era para os pés!”.
Aterrorizada, questionei mamãe se não faria mal essa provável confusão.
Ela disse que não, que esse tipo de hidratante era similar aos outros, mas
continha algumas substâncias mais eficientes para o trato dos pezinhos que
requeriam uma atenção especial.
Uma vez aliviada, me permiti rir diante do que me parecia uma completa
inutilidade. Gastar dinheiro comprando mais um creme só para passar no pé?
Muito melhor seria gastá-lo com pirulitos e gibis!
Ante meu comentário debochado, recebi uma rigorosa reprimenda. Mamãe
explicou que o pé de uma mulher era uma questão importantíssima. Que tinha de
ser macio, delicado, com as unhas bem cuidadas e ter um formato pequenino e
harmonioso.
Diante de tantas qualificações, lembrei que também tinha um par e baixei
o olhar em sua direção. A cada qualidade descrita, eu riscava mais um item na
minha lista de conferência mental. Afinal, os meus eram grosseiros, cheio de
cicatrizes, as unhas estavam compridas demais e o dedão estava com o “chaboque”
arrancado. E para cravar minha desgraça, eram grandes e os dedos, muito separados.
Calçada com um chinelinho, concluí que aquele pé era tão desengonçado quanto um
pé de pato.
Mas o discurso da mamãe não parou por aí, até porque ela aproveitou o
ensejo para repreender outras falhas da minha personalidade antifeminina. Falou
que uma mulher tinha de ser delicada, não poderia viver correndo pela rua. Não
poderia ficar falando alto, andar com os cabelos desgrenhados... Ah! E
principalmente: ser prendada, cuidadosa com suas coisinhas, gostar de arrumar a
casa e deixar tudo limpo e organizado.
Enfim, a cada segundo fui me dando conta de quão desleixada eu era. E as
coisas começaram a fazer sentido, pois lembrei que na escola os coleguinhas me
chamavam de “Luciana, cabelo que não penteia!” (os fios tinham vida própria,
acho que descendia da Medusa). Os meninos não me tratavam com gentilezas nem
galanteios, mas azucrinavam a minha paciência (embora deva admitir que soubesse
me defender muito bem!). E por onde passava só se ouvia a minha voz exagerada e
estridente.
De início isso me preocupou bastante. Esqueci que era criança e fui
tentar me adequar àquilo que o mundo esperava de mim. Quando as meninas
chamavam para brincar, recusava, por estar ocupada demais ensaiando os passos
que me levariam a ser uma garota delicada. E quando pensava em desistir, olhava
para o pé de pato.
Passei quase uma semana envolvida nesse empreendimento tão sério.
Colocava os pezinhos de molho para refinar a pele grosseira que os revestia.
Arrumei uns pedaços de babosa e apliquei diariamente nos fios para domá-los. Afanei
umas poções de cremes para aplicar nas faces antes de dormir. E disciplinei-me
a arrumar o quarto como toda jovem prendada faz.
A mudança logo operou resultados e os comentários de aprovação se
multiplicaram. Até na escola fui elogiada e os garotos passaram a me olhar
diferente. Tudo parecia perfeito, mas logo fiquei impaciente e enfadada com
todo aquele trabalho diário só pra ser mulher! Não demorei a chutar o balde e
mandar tudo pras cucuias.
Voltei ao gênio indomável de sempre. E permaneci assim durante toda a
adolescência e boa parte da vida adulta. Perto dos 30 anos, nunca havia
permitido que um alicate se aproximasse dos meus dedinhos, embora fosse filha e
irmã de manicure. Já em tempos de escova progressiva, ostentava uma cabeleira
volumosa e rebelde, de fios virgens de químicas ou tinturas. A maquiagem foi
incorporada tardiamente e por razões meramente profissionais, mas a falta de
habilidade não permitia exceder ao básico. A sobrancelha era cheia de falhas e
uma tentativa mal sucedida de corrigi-la por conta própria quase me deixou sem
ela. Também tinha medo de tesoura e fazer a unha, para mim, consistia
basicamente em roer os dedos até transformá-los em cotocos disformes.
Na verdade tinha outras prioridades e estava ocupada demais em correr
atrás dos meus sonhos materiais. Precisei lutar pela sobrevivência desde cedo.
Queria um emprego fixo, uma casa para morar. Então com tantas prioridades mais
urgentes, todo esse arsenal de cuidados parecia um dispêndio fútil e
desnecessário. Em bom português: Frescura! Algo que não podia e tampouco estava
disposta a pagar.
Talvez tardiamente para alguns (para mim, foi a hora certa), finalmente
chegou o momento de fazer o debut na
feminilidade negligenciada. Depois de adquirir algum conforto material e
estabilidade profissional, surgiu o desejo de me cuidar. Sem imposições, sem
pressões. Deu vontade e pronto! E começou com a depilação de buço.
Nunca quis me livrar do bigodinho porque achava que ele me conferia
força e personalidade. Mentira! Era relaxo mesmo. E embora tenha doído
horrores, senti-me tão mais leve sem aquele acessório peludo que deixei várias
outras sessões pagas. Meu lema era: bigode nunca mais!
Claro que não ficou só nisso. Aproveitando as maravilhas da tecnologia
capilar, entrei no salão como o Capitão Caverna e saí Cleópatra. Os cabelos
fartos e cacheados ficaram lisos. Muita gente a princípio estranhou, mas até
que gostei, sobretudo pela praticidade de levantar pela manhã sem precisar
passar por um ritual para tentar baixar aquela moita gigante! Eu que julgava o
salão de cabeleireiro uma futilidade que tornava a mulher uma eterna
dependente, percebi que na verdade já era refém daquele cabelo natural
horroroso.
Tal qual Norma Jeane, descolori os fios e virei Marylin Monroe. Sucesso absoluto! Além de ser ótimo para esconder os primeiros fios brancos. Sobrancelha, manicure, maquiagem, tratamentos, peelings, massagens e tudo mais. Virou rotina! E finalmente desabrochei a beleza lapidada. E o que é melhor: junto com a exuberância da maturidade, já que “coincidiu” com o ingresso na gloriosa fase balzaquiana.
Por considerar que tudo ocorreu no momento ideal, jamais me torturei com
o pensamento de que perdi tempo, que joguei a melhor fase da juventude fora e
blá blá blá! Como disse, antes tinha outras prioridades e só se fosse louca
para desperdiçar o dinheiro com que me mantinha em gastos com esmalte e
chapinha. Nem morta! Se hoje posso usufruir com tranquilidade esses momentos de
“frescurite” é porque tenho a segurança de que agora sim, está tudo no seu
“devido lugar". E graças a Deus não permiti que a inquietação de ser bela
e atraente estragasse minha infância com demonstrações precoces de vaidade.
Infelizmente, vejo que nem todas têm a mesma sorte (sim, me considero
sortuda!). E que a mídia e os padrões de educação modernos tem motivado
verdadeiras aberrações e mutilações infantis.
Essa semana estava no salão quando vi um casal entrar com três garotinhas.
A mãe de uma delas passou apenas para agendar um procedimento. Mas minha atenção
se voltou para as meninas.
Duas eram verdadeiros mini-protóticos de “periguetes”. Perdoem-me a
expressão grosseira, mas pela forma como essa “espécie” feminina vem sendo
exaltada e glamourizada pela mídia, até duvido que isso seja considerado uma
ofensa pela maioria. Vestiam o top do biquíni e um shortinho curto. Nada demais
se essas meninas realmente parecessem crianças. Mas o conjunto da obra refletia
uma imagem como se uma jovem dessas bem vaidosas e exibicionistas de repente
trocasse de corpo com uma criança de 8 anos e não conseguisse se desvencilhar
de seus hábitos, submetendo aquele corpo infantil a toda sorte de procedimentos
“embelezadores” (para mim, era horrível). Cabelos com penteados elaborados e
tingidos por tons e técnicas da moda: luzes e mechas! Maquiagem elaborada (não
entendi o porquê, já que iam tomar banho de piscina). Abdomens esticados e
contraídos (não duvido que fruto de uma preocupação precoce com dietas
restritivas). Muitas pulseiras, brincos grandes, penduricalhos nos cabelos... Um
jeito de falar bem peculiar - parecia que cada sílaba era impulsionada pelo
mascar de um chiclete. E os assuntos: esmaltes, retoques de raiz (???!!!!!),
marquinha de biquíni.
No meio daqueles dois seres estranhos, percebi uma garotinha da mesma
faixa etária. Tímida, espremida pela “exuberância” das outras. Vestida com um
maiô rosa estampado com motivos infantis; uma bermuda meio gasta; o cabelo
enrolado de qualquer jeito e preso no alto da cabeça com uma presilha plástica;
um par de óculos de grau; um pouco rechonchuda... Não deu um pio e quase nem se
mexeu. Ninguém no salão lhe deu bola. Estavam todos ocupados em admirar e
conversar com as Barbies ambulantes.
Direcionei minha atenção para ela. Invisível, ensaiou alguns passos.
Olhou um espelho, ajeitou os óculos que estavam tortos. Mexeu nas prateleiras,
pegou um frasco e – maravilha das maravilhas! – leu o rótulo do produto.
Meu desejo era levantar, abraçá-la com carinho e dizer que continuasse
assim. Mas levando em conta as circunstâncias e o ambiente, limitei-me a fazer
uma prece silenciosa, pedindo a Deus que fortalecesse aquela criança e que ela
jamais sucumbisse aos apelos dessa sociedade trivial. Que ela fizesse o que
gostasse, que aproveitasse com fervor a infância, que estudasse bastante,
tirasse boas notas, ignorasse a implicância dos garotos... E que ela, por hora,
se contentasse em ser apenas... LINDA! Que é exatamente o que toda CRIANÇA é!
Naturalmente linda, sem artifícios nem maquiagem. A beleza incomparável da
infância, que nem todos os salões do mundo juntos são capazes de reproduzir.
Ela foi embora, mas minha prece permanece repetida como um mantra.
Talvez nem seja ela quem precise destas orações. Muito provavelmente quem
necessite urgentemente de preces e de proteção sejam as outras duas meninas e
suas réplicas espalhadas pelo mundo. São elas que estão tendo não apenas a
aparência, mas principalmente, a infância vilipendiada e destruída por valores
e questões absolutamente inapropriadas para sua idade. Isso ninguém jamais
poderá lhes restituir. Está perdido para sempre!
Minha mãe é uma bruxa!
Toda mulher sabe (embora não admita) e todo homem (casado) já aprendeu a
duras penas: existem coisas que só podem ser ditas por nós, exemplares
femininos da espécie.
Ditos, estes, num monólogo exagerado, assistido por uma plateia (marido)
tensa, preocupada em disfarçar qualquer expressão facial que denote censura,
choque, discordância ou mesmo a anuência. Pois até essa última, aparentemente
tão propícia às interpretações positivas, pode ser uma perigosa armadilha
diante de uma fêmea com o olhar treinado e o ouvido bem atento. Sabe aquela
conversa de sexto sentido? Bobagem! É apenas o saldo de uma leve dose de paranoia
acrescida aos cinco convencionais.
Dentre essas “declarações perigosas”, podemos citar alguns clássicos:
“Nossa, como estou gorda!”, ou ainda, “A nossa vizinha está linda, com um
corpão maravilhoso!”. São exemplos de frases inocentes com alto potencial de
destruição. Nesses casos, homens inexperientes, acreditem: se você ainda não
domina a refinada arte da dissimulação, é melhor manter-se da forma mais neutra
possível. A não ser que desejem uma temporada de noites mal dormidas no sofá.
Mas nenhuma destas expressões delicadas é capaz de sobrepujar, em nível
de risco, ao desabafo irado de uma mulher que chuta o balde do quarto
mandamento e reclama com todas as letras: “Minha mãe é uma bruxa!”.
Nestes instantes temperados por forte emoção e seguidos de profunda
culpa, nós, filhas, arrancamos das entranhas do nosso subconsciente toda a rivalidade,
competição, inveja e ciúme que, sozinhos, já são difíceis de assumir que
carregamos em nossa bagagem psíquica. Imagine, então, quando o alvo de tudo
isso é a nossa santa mãezinha. Haja autoflagelação para expiar tanta maldade!
Afinal, trata-se um comportamento socialmente, religiosamente e moralmente
repreensível. Praticamente uma senha vip para o inferno!
No entanto, o motivo que me levou a escrever não é nenhuma síndrome
pseudoterapeuta, repleta de teorias presunçosas e psicologia de boteco. Mas a
necessidade de compartilhar a experiência não apenas da minha história, mas
também de outra pessoa muito importante para mim. A causa de tantos dilemas
existenciais e dos gastos com analista (quiçá, da razão da existência dessa
profissão): minha mãe, atualmente uma mulher na fase crítica dos 60 anos em que
me inquieta não apenas a sua autonomia e integridade física. Egoisticamente
falando, temo também pelo MEU estado psicológico em virtude das transformações
comportamentais típicas da senilidade, quando se multiplicam as manias, os
resmungos e as inconstâncias emocionais. Se agora já é difícil honrar com
paciência e tolerância o mandamento filial, imagine, então, quando ela estiver
no auge da impertinência.
Na verdade tive problemas com minha mãe desde que NÃO me entendo por
gente. Explico: apesar de conscientemente não recordar patavina dos meus
primeiros dias de vida, ela lembra muito bem, o que me conferiu uma lembrança
por associação. Segundo a matriarca, fui a única da prole a recusar o seio
acolhedor logo na primeira tentativa de amamentação. E nem sua zelosa
insistência foi o bastante para convencer a beneficiar-me das maravilhas do
leite materno. Dez dias depois, a guerreira desistiu da empreitada. Quanto a
mim, ganhei uma imunidade baixa e doenças que quase me arrancaram do seio
familiar antes de completar o primeiro ano de vida.
Talvez essa rejeição preconizasse as dificuldades e conflitos que
enfrentaríamos logo na infância. Não sei. O fato é que desde cedo nós duas não
nos demos bem. E tamanha era a nossa semelhança de temperamento, que a dimensão
gigantesca da similaridade nos cegava e só permitia enxergar defeitos mútuos.
Claro que levando em consideração fatores como maturidade, experiência e
“hierarquia sociofamiliar”, eu saía perdendo. Mamãe era mais velha, mais
experiente e era A MÃE. Ponto final! Cabia-me apenas obedecer e concordar
pacificamente com suas ordens e opiniões, sem questionamentos nem respostas
atrevidas.
Ah! Mas quem disse que a vida é simples assim? Nunca fui capaz de ficar
calada. Sempre analisei, questionei e relativizei todas as suas declarações. E
minha mãe, saída de um modelo familiar de perfeita submissão filial, jamais foi
capaz de aceitar que eu representava o papel de filha de uma maneira bem
diferente do que ela representou. E sem saber COMO lidar com a situação,
recorreu ao caminho da repressão e da censura. O que, por sua vez, atiçou as
tensões, alimentando em ambas um estado frequente de combate e autodefesa.
Quando ela dizia algo, o tom expressava provocação (ou pelo menos era
assim que soava aos meus ouvidos), e sabe-se lá por qual razão, me cabia a
“missão” de responder de forma antagônica. E vice-versa. Praticamente um jogo
de gato e rato, com as duas atentas ao que cada uma iria falar ou fazer. Uma
tensão constante.
Alguns desses embates eram tão ridículos que às vezes ficava difícil
determinar quem era a mãe e quem era a filha. O nível intelectual da discussão
beirava o marco zero. Uma delas ocorreu quando eu tinha uns oito anos. O
motivo? A letra da música “Tristeza Danada”, de Agnaldo Timóteo.
Um dos vizinhos adorava ouvir a canção e com a repetição, aprendi a
letra. Ou não, já que na visão crítica da mamãe uma vogal fazia toda a diferença.
E enquanto cantarolava feliz e despreocupada a última parte da música – “Vem
PARA ficar comigo” – ela, impiedosa, interrompeu-me para dizer que não se dizia
PARA, quando o correto seria a forma sincopada PRA.
Bobagem, diria você. Acontece que o tal tom provocativo que aprendi a
ouvir soou como um aviso PRA voltar ao ringue. E o romantismo e doçura da letra
foram para as cucuias diante da discussão, que o que tinha de banal, tinha de
acirrada. Eu, da forma mais inconsequente e BURRA possível, continuei
insistindo em cantar a letra do meu jeito. Em alto e bom som. E ela não se
conteve, passando a criticar e repetir agressiva e debochadamente a forma
ridícula como eu pronunciava a conjunção da discórdia. Não demorou muito até
que o título da música se tornasse realidade. Depois de levar uns tabefes,
terminei meu dia numa “Tristeza Danada”...
Acontecimentos desse tipo foram, aos poucos, construindo em torno dela
uma imagem de BRUXA. E o antagonismo que se instaurou entre nós me fez crer que
éramos duas personalidades completamente opostas, sem qualquer afinidade.
Nossos gostos, preferencias, objetivos, visões e ideologias diferiam por
completo, onde, a mim, cabia o lado BOM da história. Enquanto eu era a mocinha,
ela era a bandida. Só depois de muitos anos fui capaz de admitir que todas as
nossas diferenças residiam no fato de que éramos muito mais parecidas do que
imaginávamos. Duas bicudas a se bicar com força.
Contudo, chegou o dia em que me dispus a enxergar mamãe com outros
olhos. No instante em que o próprio amadurecimento, forjado pelas provas de
fogo da vida, tornou meu ouvido menos crítico ante suas costumeiras queixas e
lamentações.
O sentimento de empatia despertou naturalmente quando me identifiquei
com situações vividas por ela. Quando fui capaz de compreender que muito
daquilo que julgava como um comportamento inexplicavelmente agressivo e amargo,
era fruto de experiências traumáticas de uma dificuldade bem superior às
provações que eu já havia passado e que costumava supervalorizar de tal maneira
que praticamente justificavam todas as MINHAS lamentações. Enquanto EU era a
mártir incompreendida, mamãe era a ALGOZ cruel.
Foi assim por muito tempo. Até que um dia, bem recentemente, deitada
numa rede enquanto ela me observava sentada numa cadeira velha, ouvi uma
história tão dramática que no primeiro momento me pareceu surreal. Era difícil
aceitar que minha mãe havia protagonizado um roteiro de novela mexicana à la “Maria do Bairro”.
Talvez essa recusa nascesse da culpa em admitir a injustiça pela minha
frequente intolerância. Mas esse foi um momento muito importante, pois a partir
de então passei a enxergá-la não como o modelo de heroína perfeita que minhas
expectativas irreais (e cruéis) impuseram. Longe disso. Assim como eu, você e
qualquer outro, mamãe é um ser humano. Uma mulher, com uma história sofrida,
cheia de altos e baixos. E tal conclusão, que dita assim, de forma tão simples,
faz parecer algo escandalosamente óbvio, foi, na prática, bem mais difícil de
constatar. Porque enchemos o mundo e as pessoas que nos rodeiam de expectativas
absurdas. E como diria Madre Teresa de Calcutá, quem julga as pessoas não tem
tempo de amá-las.
Não vou dividir com vocês os pormenores de tal sofrimento. Mas faço
questão de compartilhar a mudança que isso projetou em nossa relação. Afinal,
foi uma experiência de mão dupla: eu me dispus a ouvi-la, mas ela se dispôs
primeiro a me contar. Escolheu-me para abrir seu coração. E certamente o fez porque
foi capaz de enxergar, com o típico olhar materno de raio-x, que eu já havia me
tornado uma MULHER, madura o bastante para compreender que a vida não é uma
fórmula mágica e que as pessoas não vem ao mundo nem entram em nossas vidas com
rótulos que definem com perfeição aquilo que são e o que deveriam ser.
Ela, afinal de contas, é a mãe que precisamente mereço, necessito e
tenho! Ponto final! Sou um pedaço dela, e ela está em cada pedaço de mim.
Talvez seja cedo para dizer que nossa relação tenha alcançado o Nirvana,
mas já deu bons passos adiante. Bom PRA nós duas - síndromes do espelho uma da
outra - que finalmente passamos a nos gostar e, por consequência, a admirar o
reflexo que no fundo debochava da ironia que residia em toda aquela rivalidade.
Beijocas!
terça-feira, 18 de junho de 2013
Eu vou te dizer para que serve um protesto!
Ontem à noite, fiquei arrepiada com a resposta
que uma filha, simpatizante do movimento pelo passe livre, deu à sua mãe
através do Facebook.
A mãe da jovem, que havia militado no movimento
Feminista durante quase toda vida, hoje está “em casa, guardada por Deus,
contando o vil metal!”. Resultado, talvez, de certo cansaço físico e emocional
imposto pela idade e, sobretudo, por uma incômoda sensação de que seus esforços
possam ter sido inúteis. Afinal, a violência contra a mulher atinge marcas cada
vez mais alarmantes e a desigualdade de gênero ainda impera em nosso país.
A versão “madura” daquela mulher, que outrora lutou
nas fileiras dos protestos dos anos 70 e 80, postou em sua rede social um
contundente “sermão” contra os vândalos que estavam poluindo o meio-ambiente
através da queima de pneus nas avenidas da metrópole.
A filha, indignada, respondeu o post com um misto
de surpresa e revolta, afirmando desconhecer a própria mãe e enumerando sólidos
argumentos que explicitavam não apenas a pequenez do gesto diante do arsenal de
poluentes que são diariamente lançados no planeta pelas empresas, com a adesão
e conivência do governo, como também todas as razões, muito mais abrangentes e
profundas, que levaram àquela massa a empreender tamanho protesto.
Não enxerguei ali um desrespeito ou desamor filial.
Muito pelo contrário. Vi, sim, a mais bela demonstração de reverência que uma
filha poderia dar à sua mãe. Pois aquela jovem rebelde estava repetindo
a cena que um dia sua genitora protagonizou, e demonstrando a firmeza de caráter
moldado pelos princípios que certamente recebeu no seio doméstico. Uma educação
que foi muito além da visão estreita e egoísta de uma sociedade cada vez mais
individualista. Uma educação que mostrou através do EXEMPLO que a indignação
deve sempre se sobrepor ao conformismo, e que a visão crítica deve prevalecer.
Pois é. Essa mãe hoje, talvez vítima de uma miopia que com o tempo se instaura nos mais bem intencionados olhos e, me
arrisco a afirmar, com os instintos protetores maternos falando muito mais alto
(o que é absolutamente compreensível), deveras desejava proteger sua cria e
convencê-la, através de contradições, a sair do meio do olho do furacão. E que
bom que isso soe contraditório para a moça! Que bom que ela diga “não te
conheço!”! Sinal de que sua mãe demonstrou, na maior parte da vida, que era
coerente com seus princípios e seu comportamento. E sua filha absorveu de tal
forma essa realidade que se achou no direito de indignar-se e questionar aquele
absurdo “lapso” temporário materno.
Essa mãe, ainda que aparentemente descrente em relação
à própria fé, não falhou!
Mesmo que boa parte dessa geração que um dia brigou
contra a ditadura, contra o capitalismo, contra a burguesia, tenha aos poucos
sucumbido ao poder, ao dinheiro ou simplesmente ao conforto, ainda assim,
deixou o seu legado!
O mínimo que se tenha obtido dessas lutas, o pouco
que seja, É ALGUMA COISA!
A reprodução espontânea da rebeldia e do clamor
generalizado, É ALGUMA COISA!
Ruim mesmo é o NADA! A INÉRCIA! O CONFORMISMO! A
COVARDIA!
Só se aprende a fazer algo, FAZENDO!
Essa mãe recebeu da filha a mesma lição que
um dia ensinou. É a mágica da vida, o feitiço do tempo se manifestando de forma
sublime.
Eu sei que se hoje tenho o direito de escrever esse
blog, de desfrutar alguma liberdade ou, no mínimo de poder manifestar a minha
indignação quando ela é cerceada, devo em parte a essa mãe, que no passado brigou
pelos direitos que agora usufruo.
Certamente me incomoda um pouco ver a guerreira
mudar o seu discurso. Mas isso não será suficiente para deixar de acreditar em
pessoas que lutaram como ela e muito menos na causa que defenderam. Até porque,
tenho plena convicção que embora um pouco constrangida pelo “sermão” da filha, no fundo, no fundo, ela sente orgulho da
nobreza de sua criação!
Vamos à luta, cunhãs!
quarta-feira, 8 de maio de 2013
Manifesto em prol de Bia Figueiredo - Diva da Velocidade
Tadinha da cunhã... |
Incrível o que nós, Feministas de Arake, orgulho da nossa espécie, somos obrigadas a aguentar!
Depois de uma manhã de trabalho extra em pleno domingo, fui gentilmente convidada pelo meu amor para um almoço. Ele, muito bem vestido, vindo de um compromisso, e eu de short e camiseta.
Chegamos ao restaurante e o povo olhou e pensou: lá vai o executivo com sua amante do intervalo das refeições. Claro que aproveitei o ensejo para embarcar no clima de pura sedução e chamei-o para ir ao espaço reservado, atiçando a curiosidade e gerando especulação.
No reservado, o garçom liga a TV no único canal que estava pegando e que naquele instante transmitia a Fórmula Indy. Que eca!
Mas meu desgosto logo deu lugar à empolgação quando percebi que em um dos veículos abertos, que traziam os pilotos na volta de apresentação, havia uma mulher de macacão amarelo, ao lado daquele que parecia ser seu colega de equipe.
Entusiasmada, mostrei a moça para meu marido que, com seu peculiar tino estraga-prazer, me disse que ela era apenas uma mulher qualquer, namorada do piloto.
Revoltada, respondi que isso era impossível, já que pela leitura labial e gesticular constatei que a bonita era uma profissional que discutia tecnicamente os detalhes do circuito com o companheiro. Se fosse namorada estaria com um sorriso de orelha a orelha, dando tchau de miss pra multidão, conversando com o amado apenas para falar sobre o novo corte de cabelo da Victoria Beckham (e o quanto isso iria custá-lo), e dirigindo olhares furtivos para o circuito no intuito de identificar as curvas perigosas onde seu namorado poderia morrer estatelado abrindo caminho para que ela ficasse famosa e rica como a viúva que escreveu um livro sobre os 17 dias em que passou ao lado de um grande herói das pistas.
Não demorou muito para que meu refinado senso de observação fosse atestado, pois o locutor começou a falar sobre a única corredora a disputar a prova entre o macharal: Bia Figueiredo.
Lógico que a essa altura eu já estava com o IPod na mão pesquisando tudo sobre a carreira da cunhã antes que alguém sonhasse em tentar desmerecer a minha lindinha, e repeti, orgulhosa, os feitos que marcaram seu nome no cenário automobilístico internacional
Felicíssima, assisti a largada, ainda que a Bia não estivesse lá numa posição tão privilegiada. Por mim, estava satisfeita só por ela sair à frente dum monte de caras. E fiquei na torcida, gritando: “Me dá um B, me dá um I, me dá um A”, enquanto pensava seriamente em tatuar o nome dela em hebraico na minha nuca, até que, na primeira volta... o carro quebrou!
Lá vão parar tudo para dar início à relargada enquanto rebocavam o carro da pista. Claro que neste contexto o almoço do meu esposo estava saborosíssimo, temperado pelo doce sabor do triunfo. Por isso, só tenho uma coisa a dizer em defesa da minha diva da velocidade:
Cambada de mecânico frustrado, parem de sabotar o carro da Biazinha, porque nem que o carro quebre mil vezes, vocês nunca ocuparão a vaga de piloto dela. Se conformem em ficar aí sujando os dedos de graxa e vestindo macacão de segunda categoria e pelo menos façam o serviço de vocês direito. Por causa da incompetência de vocês tive de ouvir duas horas de piadas sem graça sobre os tipos de máquinas que as mulheres estão aptas a pilotar - fogão de no máximo 2 bocas, lavadora semiautomática que não tenha muitos botões para programação e etc.
Mas independente do resultado TEMPORÁRIO desfavorável, estou contigo e não abro, Bia Figueiredo. Sei que a essa altura você está belíssima curtindo a sua fossa numa cobertura de luxo, tomando um Dri-Martini enquanto seu namorado modelo de 22 anos lhe faz uma massagem repetindo o quanto você é maravilhosa e lembrando que na segunda vence o pagamento da mensalidade da Escola de atores em que ele está inscrito, enquanto esses machistas despeitados dirigem um carro popular 1.0 financiado em 72 meses.
Beijo, linda, sou sua fã! *-*
segunda-feira, 28 de janeiro de 2013
Uma Sorte de Zica!
A minha rebeldia nata tem explicação. Numa família de quatro
irmãos, eu tinha uma irmã mais velha e dois irmãos mais novos. Péssima
localização! Os mimos dos caçulas não me eram destinados e a supremacia da
maturidade não ocorria primeiro pra mim. Quando as pessoas viam meus irmãos
pequenos, diziam: “Que fofinhos!” Quando viam minha irmã mais velha: “Que
mulherão!”. E eu lá, com cara de pêssego, mendigando migalhas de atenção. Além
de sofrer horrores com a pentelhice dos pestinhas e a opressão da autoritária
bruxa má.
Quando finalmente a girafa saiu de casa, eu pude vislumbrar
um horizonte de possibilidades. Agora EU era a mais velha, estava na
pré-adolescência e logo iria brilhar mandando e desmandado nos fedelhos (a
serem imediatamente convertidos em escravos), e atrair os olhares de admiração
pelos novos contornos físicos que começavam a se delinear com a puberdade.
Quando tudo parecia conspirar para a minha felicidade eterna, eis
que surge uma penetra fora de hora pra estragar tudo. Minha mãe engravida na
casa dos 40 e já naquela fase do casamento em que não se sabe ao certo se é
“Namoro ou Amizade”. Mais improvável, impossível. Mas aconteceu! E eu
ingenuamente achei que isso iria contribuir para solidificar os meus planos
malignos de dominação, pois além de beldade nortista mantenedora de escravos,
teria ainda a credencial de “mãe-acessória” digna de respeito e consideração.
Balela! Mais uma vez a minha localização outrora tão
almejada, manifestou-se a meu desfavor. Ela veio da maternidade fofinha,
rosadinha e rechonchuda... Uma visão enternecedora até dar o primeiro berro! E
já na primeira noite me roubou horas de sono e infligiu torturas físicas
inimagináveis. Eu, que achava que iria reinar naquele lar, de repente me vi na
posição de pajem, abanando a noite inteira aquela coisinha gasguita e sua
(nossa) mãe exaurida pelo doloroso parto. E pensa que ficou só nisso? Foram
acalentos, banhos, doenças infantis, quedas, preocupações constantes e – Oh!
Terror! – fraldas pra lavar. Não é a toa que a alcunha que a mini-vilã recebeu
ainda bebê foi ZICA, para atestar o meu azar! Ô, ironia!
As atenções que eu almejava se voltaram todas para a
usurpadora de afeto, que além de fofinha, era precoce e inteligente. Ciúme era
o tempero ácido, azedo, picante e carregado da minha vida infeliz. Meu pai, que
antes sensível a minha condição me elegeu sua preferida, de repente me esqueceu
e voltou todas as atenções para a nova garotinha do papai.
Motivos não me faltavam para detestá-la. E eu, que de boba
não tinha nada, tratei de botar minha viola no saco e buscar atenção noutra
freguesia. Lutei, trabalhei, batalhei até conquistar meus objetivos. Li,
estudei, pesquisei, viajei e reuni bagagem intelectual. Como mulher, atingi a
plenitude, desabrochando a beleza e o encanto da maturidade. E depois de
finalmente resolver as pendengas particulares, voltei meu olhar para aquela
criança e encontrei, vejam só, uma linda mulher!
Dialogando descobri outras maravilhas: ela já não berrava.
Pelo contrário, falava baixo. E pouco. Minha curiosidade fez extrair sua
personalidade a conta-gotas, num exercício de paciência e tolerância incomum
pra minha personalidade. Pensei: talvez seja amor! E quanto mais eu me envolvia
em sua vida, mais queria saber sobre seus projetos, me interessava pelo seu
futuro.
Em ocasiões de conflito, me vi defendendo seus interesses,
protegendo-a de situações difíceis da vida que embora eu tivesse vivido sem
ninguém pra me proteger, não queria que ela sofresse o mesmo. E então percebi
que até o ciúme tinha ido embora.
Na hora de um deslize, nada do discurso arrogante e da
empáfia típica de quem sabe mais. Mas sim, o desespero humilhante para tentar
convencê-la a fazer o melhor. E, pasmem, me descobri sendo, de fato, a irmã
mais velha. Não a figura opressiva, ditatorial e tirana criada por uma mente
infantil e maquiavélica. Pelo contrário, a própria encarnação do exemplar
maternalista, protetor e totalmente desequilibrado pela emoção de amar incondicionalmente
essa parte de mim, sangue do meu sangue, minha irmãzinha caçula e encantadora
que só precisou ser ela mesma pra se fazer amar. Plano melhor do que esse,
impossível realizar. Arquitetei triunfos e me dobrei pelo afeto. E sou feliz
por isso!
Irmã, hoje você faz aniversário. E agradeço a Deus por fazer
parte da minha vida. Não lhe peço perdão pelo meu comportamento passado por
dois motivos: primeiro, porque não tinha maturidade suficiente pra lidar com
isso; segundo, porque sou orgulhosa pra caramba! Mas aceite que hoje essa sua
irmã mais velha está aqui para o que der o vier, e por ti daria até a vida, se
necessário (pelo amor de Deus, não invente de testar). Agradeço a Deus que em
sua infinita sabedoria mandou para nossa família o presente cujo brilho só enxerguei
anos depois. E que este Deus bondoso abençoe sua jornada e te dê tudo de
maravilhoso que eu gostaria de te dar. Feliz Aniversário!
segunda-feira, 21 de janeiro de 2013
“Antes ser idiota para as pessoas que infeliz para si mesmo!”
Há poucos dias vi um “protesto” de um
desses alienígenas intelectuais revoltados pela malfadada sina de terem sido
expulsos de seu Éden Cultural e nascido em meio a um reduto de seres inferiores
que torturam sua mente privilegiada com comentários idiotas e hábitos
desprezíveis.
Acreditava ser esse comportamento apenas
uma exclusividade de artistas de emissoras badaladas com egos inflados pela
aclamação midiática ou de gênios consagrados que perderam a paciência com as mesquinharias
exaustivamente expostas através dos meios de comunicação. Afinal, de um jeito
ou de outro, em ambos os casos, os “reclamantes” adquiriram tal direito, seja
pela ilusão de poder criada a partir da idolatria praticada ao seu redor (no
caso dos “artistas globais”), seja pela vasta contribuição que de fato deram à
cultura (caso, mais justo por sinal, dos gênios consagrados).
Embora o bom senso e a empatia nos permita
compreender alguns acessos de rebeldia (considerando o arsenal de futilidade
bombardeado pelos quatro cantos do mundo), não raramente nos deparamos com verdadeiros
exemplares de arrogância e prepotência autointitulando-se a elite da cultura, o
suprasumo da intelectualidade, mártires do “Movimento Inquisidor em prol da
ignorância”.
Aquela atriz magricela Thaila Ayala protagonizou
um desses espetáculos de empáfia, numa entrevista à Revista Gloss (edição 47, Agosto 2011), quando
comentou que o momento de transição em que o planeta está passando irá
favorecer a sua “espécie” superior, expurgando da face da Terra toda essa
plebe ignorante e deixando no planetinha azul apenas os “evoluidíssimos”, grupo
do qual ela se julga inserida. E que mal pode esperar por esse momento,
ainda que as previsões sagradas preconizem desgraças, cataclismas e morte.
Fazer o que, a moça é “evoluída”, né? Tem passaporte garantido para a primeira
classe no evento apocalíptico da hecatombe mundial.
Se o piti da “pseudo-atriz-modelo-namoradadopaulinhovilhena”
já é digno de pena (pra dizer o mínimo), o que dirá desses que nem sequer se
sabe de que canto saíram. De onde veio, para onde vai. Esses que lêem uma crônica
como “A Revolução dos Idiotas” de Nelson Rodrigues e não apenas se identificam como ainda se equiparam ao autor, chegando a derramar lágrimas de emoção por finalmente encontrarem
alguém que tenha tido o privilégio de acompanhar seu brilhante raciocínio incompreendido, compartilhando da dor de ter renunciado de seu lugar no Olimpo para vir a
Terra cumprir a dolorosa missão de fazer avançar os Chimpanzés que a povoam.
Concordo plenamente que presenciamos a
vulgarização e a banalização da informação. Que existem milhões de aspirantes à
fama cometendo exageros em todas as esferas e em todos os níveis imagináveis. Exageros
esses justificados por termos da moda, como o exerício do “Marketing Pessoal”,
da consolidação de um “Networking” e até do receio de serem vítimas do “anafalbetismo
digital” e excluídos dessa nova era de modernidade que requer a exarcebação da
exposição. Porém, entendo mais ainda que absolutamente ninguém seja obrigado a
se colocar como vítima indefesa dessa realidade, nem que precise
necessariamente ser avesso a todo e qualquer tipo de ferrramenta de
comunicação a fim de evitar ser "contaminado" pela sujeira das massas.
Praticamente todas as redes sociais possuem
recursos de controle e personalização do conteúdo. Isso, é claro, se você
quiser cadastrar-se em uma. Não preciso comentar sobre novo líder do BBB, saber do último
bafão da briga da Galisteu ou conhecer de cor a letra do hit “Esse Cara sou Eu”
pra me sentir inserida nesse mundo. Sofrer preconceito por não saber o que
aconteceu com a Morena do Salve Jorge? Porque todo mundo sabe e eu não?
Sentir-me excluído, oprimido, defasado? Meu bem, você só sente isso SE VOCÊ
QUISER. Se não estar por dentro de nada disso REALMENTE SIGNIFICAR ALGUMA COISA
PRA VOCÊ. Ora, bolas, como posso me sentir excluído de um grupo do qual nunca
julguei fazer parte? Dane-se. Agora se isso de fato é um incômodo, acho que precisa
rever não o fato de considerar-se A VÍTIMA dessa sociedade vulgar, mas sim, se realmente
as suas convicções e sua “superioridade intelectual” são tão suas assim. Se seu
discurso de supremacia ariana não é, na verdade, DESPEITA por não estar sob os
holofotes da mesma fama que tanto critica.
Que cada um faça o seu caminho. Que cada um
expresse suas idéias. Que cada um exerça o direito de expor sua preferência ou
rejeição por A ou B. Mas que, sobretudo, antes de fazer isso, possamos ser
sinceros e autênticos com aquilo que sentimos, aquilo que fazemos e aquilo que
dizemos. Deve ser nesse sentido o nosso maior esforço: autoconhecimento. Porque
quando essa harmonia ocorrer já haverá maturidade suficiente para trilhar o
próprio caminho sem a necessidade de ridicularizar e humilhar pessoas
só para mascarar a debilidade da autoestima, ainda carente e desejosa do veneno que rejeita.
* O título dessa postagem é uma frase de Arnaldo Jabor!
* O título dessa postagem é uma frase de Arnaldo Jabor!
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